Velhos Brinquedos, Novas Saídas - Por Belkis Carolina Calsa - Advogada e Professora



Velhos Brinquedos, Novas Saídas

Por Belkis Carolina Calsa - Advogada e Professora


Se pudesse oferecer esta reflexão para algo ou para alguém, ofereceria aos meus velhos brinquedos que morreram queimados há cerca de uma década, num galpão velho que meu pai mantinha junto à horta.


Penso neles com a alma como que desabituada do mundo, com melancolia de um tango antigo. Aqueles brinquedos mantinham meu coração eternamente infantil. A infância é a grande metáfora do tempo. “Perdeu-se nos desfiladeiros da névoa, por tempos reservados ao esquecimento, nos labirintos da desilusão”. (Cem anos de Solidão – G.G. Marquers).


Quero falar aqui, brevemente, da importância do brinquedo na construção da subjetividade. Não vou entrar em detalhes. Não pensarei Schopenhauer que afirma haver no homem à ilusão da individuação, que isso certamente responde por egoísmo e é, portanto, a raiz de todo o mal.


O brinquedo é fundamental para que o sujeito conheça a si mesmo, indiferentemente se é praticado no coletivo ou no aspecto individual. O homem se constrói desta maneira, brincando!


O brinquedo constrói o conceito. O brinquedo afasta o medo.


Subjetividade é construção íntima que depende dos contatos do sujeito com o mundo dos objetos, vivos e inanimados. Este contato vai construindo os espaços interiores do sujeito onde efetivamente estará configurado quem ele é.


Tanto o brinquedo é importante neste aspecto pedagógico, que toda uma cultura nele está fundamentada. Há inúmera literatura enaltecendo o incentivo que devem dar os mestres, para ludicidade em sala de aula, nas primeiras séries do curso fundamental.


Ninguém ignora que o brinquedo coletivo desenvolve hábitos de sociabilidade necessários para o convívio harmônico do sujeito com seus semelhantes e, portanto, intersubjetivo, bem como o do sujeito com ele mesmo, e neste caso, sua subjetividade.


O brinquedo que serve para folguedos individuais, longe de fomentar o egoísmo, me parece ser o mais indicado para tentativa de reverter casos graves de desvio de conduta, como no lido de menores infratores. E ninguém parece estar preocupado com isso: Auto-estima e subjetividade. Ambas andam de mãos dadas.


O problema parece ser de que essa criação recente da subjetividade, vinda da individuação do sujeito frente ao grupo, inexistente na idade média, encontra-se hoje ameaçada de esmagamento, de extinção, pela globalização. O marketing é por demais agressivo, a disputa de mercado abusiva. É impossível o recato, qualquer que seja, todos estamos expostos a tudo. Onde fica a liberdade? Onde fica a subjetividade? Desapareceram! É aí que deve entrar a força do brinquedo, na construção deste ideal de intimidade consigo mesmo, e que pode salvar a sanidade mental do sujeito homem.


Existe uma natureza humana? Não sei, mas existe uma natureza brincalhona, no gatinho nascido na última ninhada e no homem que se arrasta de bengala pela calçada.


É possível estabelecer uma relação entre verdade e subjetividade? Para Kierkegaard, citado por Rubem Alves, sim, pois “verdade é subjetividade”. E continua: “É que a verdade habita o mundo do determinismo e os poemas constituem o mundo da liberdade”. E diz ainda mais, que “O poema interdita o dogmatismo por ser, no fundo, uma confissão”. Sendo assim podemos concluir que o poema é o brinquedo do poeta.


Que tal brinquedo serve para esclarecer o que jaz no subconsciente, sendo assim fundamental para a construção da subjetividade. É uma espécie de passado pacificado pelo presente, a infância pela adultez constituída subjetivamente pelo poema-brinquedo.


Belkis Carolina Calsa

Advogada e Professora

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